Luís Carlos Luciano
Jornalismo e literatura se entrelaçam numa história de vida

Pacheco, Franco e o aprendiz de ermitão

Três amigos saíram para pescar. Ficaram cinco dias às margens do Dourarilho, em uma fazenda muito bonita e cheia de gado, ocupando dois ambientes naturais sob a mata ciliar. Em um deles instalaram o “rancho”, com a cozinha, as bebidas e os apetrechos e no segundo amarraram as redes para descansar, pois, ninguém é de ferro. Pescaria dá uma canseira danada.
Fora do barranco, no pasto, instalaram a barraca. A Natureza, perfeita, deixou até um tronco grosso de árvore onde escoraram as panelas e foi útil para um “girau”, uma espécie de mesa feita com bambu, galhos e amarrada com cipó.
Pacheco e Franco são mateiros, ajeitados para fazer as coisas e sem preguiça. O aprendiz de ermitão, sonhador e que deseja fazer uma casinha no mato e ocupar o seu tempo ouvindo pássaros, pescando e olhando para onde as formigas vão, ajudava na medida do possível.
Franco, depois de uns goles antes do almoço e outros antes da janta, conversava mais do que o homem da cobra; Pacheco, o líder, nem sempre tinha paciência para tanta prosa e o aprendiz, sem muita intimidade com a vara, minhoca, isca, isto e aquilo mais, agradeceu a Deus por ter bons ouvidos.
Depois de meia dúzia de cerveja, a conversa entrava por um lado e saia por outro. Era proibido ficar sóbrio no acampamento. Papo firme, fiado e histórias, muitas mesmo. Até o macaquinho parava para escutar o homem falante. Como ria, como gesticulava, faceiro, muito alegre. Quando dormia, esperava-se um pouco mais de silêncio. Mas que nada. Roncava alto.
Não fosse o blá-blá-blá etílico, a pescaria não teria a mesma diversão.
Mosquitos, mutucas, formigas, era uma festa generalizada. O que teve de mutuca “zuzubem” não foi brincadeira.
À noite, tinha um pássaro com canto forte, cujo nome Pacheco e Franco sabiam, mas o ermitão já se esqueceu. Ele fazia um som que parecia assim: “amanhã eu vou (...) amanhã eu vou...”.
O macaquinho desamarrou a corda da rede e o aprendiz se esborrachou no chão. Lá no alto das árvores, ele deve ter achado divertido o tombo do gordinho.
De dia pescava-se peixes pequenos para serem usados de isca à noite. Pacheco pegou um dourado. Foi o maior, algo de 4,5kg, mas os nanicos deram uma boa fritada. O capataz descia todas as tardes até o local não se sabe para vigiar os visitantes ou para ouvir as piadas, cada uma mais engraçada do que a outra. Teve piada que foi contada umas dez vezes e em todas elas as risadas eram escancaradas.
O auxiliar do capataz ficou impressionado com tanta traia levada em dois carros pequenos. Contaram histórias de lobinhos do mato, bocas de sapo, sucuris, capivaras, tatus, queixadas e mateiros.
O aprendiz de ermitão viu sim é muita aranha, mas não largava do facão e do farolete à noite. Numa noite, um tatu galinha se aproximou e deu um susto. Ele ia arrastando as folhas e fazendo barulho. Franco rapidinho foi passar um fax e o Pacheco saiu correndo atrás do bicho. O aprendiz ali, firme, com uma latinha na mão.
Dias e noites maravilhosas se passaram como um sopro, apesar de toda improvisação. Eles gostam de mato, de insetos, bichos e peixes. Dizem que pescaria refresca a cabeça, mas na verdade eles são aventureiros. Pacheco, Franco e o aprendiz fazem festa com uma perna de grilo. Fazem planos para voltar ao local. A mosquitada não conseguiu espantá-los.