Luís Carlos Luciano
Jornalismo e literatura se entrelaçam numa história de vida

A peita

Enquanto a emissora, orgulhosamente verde e amarela, tocou músicas e hinos patrióticos durante a semana, os ratos correram às ruas.

A questão da peita andou e anda incomodando-os.

Murídeos queriam saber, sem olhar o rabo, sobre a banda podre.

Rabudo, rato-preto, rato-pardo, toró, o do paiol, ratazana e outros que pregavam sociedade menos hipócrita se reuniram para saber quem era o vilão do meio, quem era o mais safado...

Alguém roia covardemente a corda, espalhava futricas...

O mangusto e o tuco-tuco abriram a pauta.

O rato-dos-faraós esbravejou:

- Gente, quer dizer, ratos, não pode ser! Nós decidimos se unir e dividir o espaço do porão. Até dias atrás tinha queijo e sobra de comida para todos e todas, mas alguém está roubando a gente, quer dizer, a comunidade...

O rato-de-pentes:

- Tem desonestamente safado no meio... Precisamos descobrir esse rato gatuno!

O zunzum começou.

Líderes e liderados se mostraram confusos, sem saber para onde ir, uns foram para a esquerda, outros para a direita, alguns para o centro e muitos ficaram como baratas tontas...

Reféns da incerteza, da dúvida, com medo do gato.

Eles pirateavam a casa de um velho meio gagá, gente sem muita compostura que já tinha aprontado muitas coisas erradas na vida e estava se acabando ali, sozinho entre os seus...

Tanto que não se importava, até então, com a presença dos ratos.

O velho não estava nem aí para a voz do Brasil.

Que se dane tudo – costumava berrar...

Os ratos, portanto, tinham achado o seu Canaã.

O velho revoltou-se quando apareceram titicas no copo de água com a sua perereca. Podiam cuspir no prato que comiam, mas no copo com a perereca não! Aí já estavam abusando demais...

Tomou providências enérgicas.

Era elefante contra saúva no tamanho, mas, na essência, eram todos ratos, esse ser repugnante que causa danos e danos imensos.

Num belo dia, à frente do velho, o aparentemente inofensivo camundongo com olhar solícito para um tête-à-tête...

Conversaram, então, a língua dos ratos.

O velho prometeu status, mordomia, feitiço contra gatos e enorme queijo suíço...

Afinal, rato que se preze só se deixa subornar com queijo de boa origem.

O desentendimento disseminado na comunidade funcionou mais que veneno e ratoeira.

O conflito passou para a briga de nervos, pancadaria e daí a coisa virou tumulto e baderna, Torre de Babel. Quem já viu briga de ratos não fica perto... Entraram em pânico, se esconderam em outros buracos esperando as coisas se acalmarem.

Se na terra de cego quem tem um olho é Rei, na terra de ratos quem não é safado ainda está por nascer...

No final da estória, os ratos descobriram a origem das intrigas e traições, mas o algoz já estava longe, muito longe acumulando calorias com seu queijo jamanta.

Vovó já dizia: quem nunca comeu melado, quando come se lambuza.

Já não estava bom o resto de comida e de queijo nos pratos?

Quem mandou fazerem titica na perereca do velho?

Entre a ficção e a realidade, pode haver uma grande semelhança.

Os ratos, na verdade, podem estar mais perto do que se imagina.

O velho gagá, bom esse continua gagá como sempre e satisfeito com a perereca...

Às vezes deseja-se pintar passarinho e sai mais que urubu: sai rato!